segunda-feira, 4 de maio de 2009

19-04-2009 Trilho Chã da Franqueira (4)

5 km / Circular – Arga de Baixo (Caminha)
Rede de Percursos Pedestres Valimar

O LOBO IBÉRICO

Cabra morta há duas semanas faz renascer a esperança na sobrevivência
do Lobo Ibérico

Uma simples frase dita por um pastor de uma aldeia na Serra d'Arga foi suficiente para fazer esquecer um dia inteiro de insucesso na procura de indícios da permanência do lobo ibérico naquela zona do Alto Minho.
"Um lobo matou-me uma cabra há duas semanas", afirmou o pastor, que nem imaginava a alegria que a "desgraça" trouxe ao biólogo Francisco Álvares, que estuda a alcateia de Arga há cerca de uma década e não esconde a sua preocupação com o futuro desta população de lobos.
Esta frase, acompanhada por vários pormenores que atestavam a sua veracidade, foi o primeiro indício seguro de que o lobo ibérico continua presente na Serra d'Arga e foi suficiente para fazer regressar a esperança depois de um dia inteiro de procura de animais sem sucesso.
Uma vez por ano, mais ou menos nesta época, Francisco Álvares percorre demoradamente cerca de duas dezenas de caminhos na montanha, alguns quase intransitáveis, mesmo para um jipe, na tentativa de encontrar vestígios da existência do lobo ibérico, o último grande predador da fauna ibérica.
A uma velocidade máxima de 20 quilómetros por hora, com os olhos sempre atentos ao solo e com paragens obrigatórias em todos os cruzamentos, locais onde habitualmente os lobos deixam dejectos para marcar território, a tarefa prolonga-se durante todo o dia, do nascer até ao pôr-do-Sol.
Antigamente, quando os indícios eram muitos numa determinada zona, o biólogo regressava à noite para uivar, o que lhe permitia estabelecer contacto com a alcateia e, em alguns casos, ver os lobos.
Francisco Álvares regressou este ano à Serra d'Arga com a esperança alimentada por algumas notícias de avistamentos nos últimos meses, mas consciente de que a situação desta alcateia é muito grave.
"Ainda há lobos na serra, mas são tão poucos que é muito difícil encontrar indícios numa área tão grande", avisou o biólogo, logo no início da jornada, para evitar expectativas demasiado elevadas.
Em Junho, um lobo foi avistado nas imediações de Montaria, tendo sido visto pelos ocupantes de cinco carros que passavam na estrada, e isso era suficiente para manter viva a esperança na sobrevivência desta espécie na zona mais perto da costa atlântica de que há conhecimento na Europa.
"Não há lobos por aqui há muito tempo"!
Depois de percorrer os caminhos da Serra de S. Paio, nas imediações de Caminha, sem qualquer resultado positivo, o jipe do biólogo entrou na Serra de Santa Luzia, perto de Viana do Castelo, onde pastam cerca de 400 cavalos selvagens (garranos), que são o principal alimento dos lobos.
As expectativas foram, no entanto, limitadas logo no sopé da serra, quando um pastor deixou clara a situação actual: "Não há lobos por aqui há muito tempo."
As horas seguintes vieram confirmar esta informação, apesar de terem sido percorridos alguns dos locais onde, há alguns anos atrás, era fácil encontrar vestígios da passagem dos lobos.
Na Serra d'Arga a situação repetiu-se, tendo um habitante da aldeia de Arga de Cima assegurado que "agora não há lobos", perante o desalento do biólogo, só comparável à satisfação dos habitantes por já não terem a "companhia" dos animais.
Arga de Cima é uma localidade com uma grande ligação a estes animais, tendo mesmo baptizado a travessia de um ribeiro como "Pontão do Lobo", numa alusão ao facto de ser um antigo local de passagem das alcateias.
O último ataque de lobos nesta aldeia ocorreu há cerca de quatro anos e, desde essa altura, não houve mais notícias deles.
"Não vejo lobos há muito tempo, mas é capaz de ainda haver alguns lá em cima [na serra] porque às vezes aparecem algumas "ossadas", afirmou um caçador, que se apressou a garantir que, apesar de ser proibido, não terá problemas em abater um lobo.
O desânimo de Francisco Álvares pela falta de indícios acabou pouco depois, quando falou com um pastor da aldeia de Cerquidos, que afirmou ter perdido uma cabra há cerca de duas semanas.
O mesmo pastor assegurou ter visto "um lobo grande" em finais de Julho, explicando detalhadamente o local onde o viu e qual o caminho que o animal seguiu.
Alguns minutos depois, em conversa com um fiscal de caça, os dados foram confirmados quando ele disse ter visto pegadas de "um animal grande" praticamente na mesma altura e na mesma zona em que o pastor tinha visto o lobo. O fiscal ainda disse ainda ter tido conhecimento do desaparecimento recente de duas ovelhas pertencentes a um pastor da aldeia de Montaria.
Num dos últimos caminhos de montanha percorridos nesse dia, o biólogo encontrou os primeiros dejectos de lobo, com a particularidade de se encontrarem na zona onde o pastor de Arga de Cima disse ter visto um animal.
Minutos depois, na vertente sul da Serra d'Arga, foi encontrado o maior "tesouro" do dia: um excremento de lobo com apenas um ou dois dias, onde eram visíveis os pelos da cabra que deve ter comido recentemente.
"Ainda há esperança, eles ainda andam por aí", afirmou Francisco Álvares, visivelmente satisfeito com o achado.

Texto: Francisco Ribeiro (Lusa) 2003

Continua…

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